In Altum

Nossa Senhora das Neves, formai os nossos corações à vossa imagem

São José, homem justo

Publicado a na secção (In Altum n° 159)

Extrato de uma homilia inédita de Bento XVI, proferida na qualidade de Papa Emérito no mosteiro Mater Ecclesiae, no domingo 22 de Dezembro de 2013

Caros amigos, ao lado de Maria, Mãe do Senhor, e de São João Batista, a liturgia de hoje apresenta-nos uma terceira figura, na qual o Advento é quase uma pessoa, uma figura que incorpora o Advento: São José. Ao meditar o texto do Evangelho, podemos ver, parece-me, três elementos constitutivos desta visão.

O primeiro elemento, decisivo, é o facto de São José ser chamado "um homem justo". Para o Antigo Testamento, esta é a mais alta caraterização de alguém que vive verdadeiramente segundo a palavra de Deus, que vive a aliança com Deus (...) Este é, portanto, o primeiro e fundamental elemento da figura de São José tal como aparece no Evangelho de hoje. Agora, duas palavras muito breves sobre o segundo e o terceiro elementos.

 

A segunda: ele vê o anjo no seu sonho e ouve a sua mensagem. Isto pressupõe uma sensibilidade interior a Deus, uma capacidade de percecionar a voz de Deus, um dom de discernimento, uma capacidade de distinguir entre sonhos que são sonhos e um verdadeiro encontro com Deus. Só porque São José já estava a caminho da pessoa do Verbo, do Senhor, do Salvador, é que ele pôde discernir; Deus pôde falar-lhe e ele compreendeu: isto não é um sonho, isto é a verdade, isto é a aparição do seu anjo. Foi assim que ele soube discernir e decidir. Esta sensibilidade a Deus, esta capacidade de perceber que Deus está a falar comigo, esta capacidade de discernimento é igualmente importante para nós. É claro que, normalmente, Deus não nos fala como falou a José através do anjo, mas também tem as suas próprias maneiras de nos falar. São os gestos de ternura de Deus, que temos de perceber para encontrar alegria e consolação; são palavras de convite, de amor, até de pedido no encontro com pessoas que sofrem, que precisam da minha palavra ou do meu gesto concreto, de um ato. Aqui, é preciso ser sensível, conhecer a voz de Deus, compreender que Deus me está a falar agora e responder.

 

É preciso ser sensível e conhecer a voz de Deus.

Isto leva-nos ao terceiro ponto: a resposta de São José às palavras do anjo foi a fé e depois a obediência. Fé: compreendeu que era realmente a voz de Deus, que não se tratava de um sonho. A fé torna-se um fundamento sobre o qual agir, sobre o qual viver, reconhecer que é a voz de Deus, o imperativo do amor, que me guia no caminho da vida, e depois fazer a vontade de Deus. São José não era um sonhador, embora o sonho tenha sido a porta pela qual Deus entrou na sua vida. Era um homem prático e sóbrio, um homem de decisão, capaz de se organizar. Não creio que tenha sido fácil encontrar o estábulo de Belém como um lugar discreto e protegido, apesar da pobreza, digno do nascimento do Salvador. Organizar a fuga para o Egipto, encontrar um lugar para dormir todos os dias, viver durante muito tempo: tudo isto exigia um homem prático, com sentido de ação, capacidade de responder aos desafios, de encontrar formas de sobreviver. E depois, no seu regresso, a decisão de voltar a Nazaré, de aí estabelecer a pátria do Filho de Deus, mostra também que ele era um homem prático, que, como carpinteiro, vivia e tornava possível a vida quotidiana. Assim, por um lado, São José convida-nos a este caminho interior na Palavra de Deus, a estarmos cada vez mais próximos da pessoa do Senhor, mas ao mesmo tempo convida-nos a uma vida sóbria, ao trabalho, ao serviço quotidiano para cumprirmos o nosso dever no grande mosaico da história.

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